Actuando num clima de instabilidade/complexidade/incerteza, os líderes são forçados a trabalhar num quadro mental diferente daquele que os estados de estabilidade, coerência e coesão requerem.
No mundo actual, as organizações humanas funcionam num estado de instabilidade dita limitada. Esta instabilidade é agora uma propriedade fundamental dos sistemas de negócios e governação bem sucedidos. Ela é condição-chave para provocar a inovação, ou seja, a procura de ordem a partir do caos.
Foi já em 1992 que o conhecido autor Ralph Stacey escreveu que a ciência da complexidade dos sistemas dinâmicos proporciona um modelo mental totalmente diferente para interpretar o comportamento de negócios e projectar acções de gestão inovadoras (in Managing Chaos).
O mundo da governação política é cada vez mais ditado por um feedback interactivo contínuo (semelhante ao dos jogos competitivos verdadeiros), com muitos aspectos instáveis.
Neste tipo de cenários caóticos, os líderes não podem confundir êxito com simples estabilidade (esta é sempre temporária e pode ser enganadora). A governação é feita cada vez mais à vista desarmada mas apoiada com o máximo de dados e informações provenientes de diversos lados. Assim, diz Stacey, "adoptar uma perspectiva de sistemas dinâmicos leva a uma resposta diferente (do equilíbrio estável próprio de épocas anteriores). (...) que reconhece a importância da contradição e da tensão criativa".
A aprendizagem torna-se então numa necessidade imperativa. Os governantes têm de abandonar velhas crenças, procedimentos e talvez modelos mentais já esgotados. A aprendizagem de um novo modelo mental é complexa, pode ser entendida como algo ameaçador, é geradora de ansiedade e toca, por vezes, em características pessoais profundas.
OS FEITICEIROS DA ESPIRAL
Da formação de um líder devem hoje constar conhecimentos cruciais sobre os diferentes tipos de mentes com os quais trabalha. As pessoas possuem sistemas de ideias, crenças e valores que podem ser profundamente diferentes de indivíduo para indivíduo mesmo que mergulhados na mesma cultura e na mesma sociedade.
A diferença encontra-se nos "estádios distintos de desenvolvimento da consciência" os quais fazem com que uma pessoa possa estar num patamar de desenvolvimento totalmente diferente até do da sua esposa fazendo com que subtilmente (ou de forma mais vigorosa) ocorram conflitos, incompreensões e desentendimentos, muitas vezes reclamados como "tu não entendes o que eu quero dizer", na verdade significando que "tu não entendes a minha mente e o que eu PENSO sobre aquilo que, afinal, nos separa"!
É algo mais profundo do que acontece com as vulgares "diferenças de opinião" ou "níveis de cultura e saber". Tem a ver muito mais com a "consciência profunda" onde se alojam a visão do mundo, os sistemas particulares de valores, o nível de existência psicológica e as estruturas de ideias e formas de pensar proprias de cada sujeito.
Baseados no trabalho pioneiro de Clare Graves, Beck e Cowan propuseram um modelo de desenvolvimento humano que, devido à sua configu-ração, recebeu o nome de Dinâmica da Espiral. Este modelo tem sido validado e não refutado por diferentes pesquisas. Segundo este modelo, o ser humano nasce no estádio 1 e pode evoluir até ao estádio 9 dependendo essa evolução de múltiplos factores psicológicos, culturais e sociais. Escreveu Graves: “é um processo espiralado, emergente, oscilante, marcado por uma progressiva subordinação de sistemas de comportamento mais antigos e de ordem inferior a sistemas mais recentes, de ordem superior, que ocorre à medida que os problemas existenciais de um indivíduo se alteram“.
A existência humana, segundo Graves, contem numerosos, provavelmente infinitos, modos de ser, enraizados precisamente nos imensos potenciais do cérebro hierarquicamente estruturado da humanidade. Mas a dinâmica humana faz com que diferentes indivíduos estejam a viver em diferentes níveis de percepção, visões do mundo e estilos de vida. Num mesmo país, numa mesma rua, encontramos indivíduos cujo estádio de desenvolvimento se distingue dos seus vizinhos, se bem que a tendência seja para se agruparem em função da partilha dos mesmos sistemas de crenças, valores e níveis de existência.
Assim, cada um dos sucessivos estádios, ondas ou níveis de existência é uma condição pela qual as pessoas passam no seu percurso rumo a estádios de existência distintos, com psicologias próprias e ajustadas a cada nível: sentimentos, motivações, ética e valores, bioquímica, grau de activação neurológica, sistema de aprendizagem, sistemas de crenças, conceito de saúde mental, conceitos e preferências relativamente a negócios, educação, economia e teoria e prática políticas (Graves,1984).
Beck e Cowan desenvolveram então o conceito de vMEME tendo como ponto de partida o termo “meme” proposto por Mihaly Csikszentmihaly em 1993. Um vMEME é um meta-meme, isto é, um princípio organizador da existência humana que actua nas nossas mentes através de crenças, estilos de vida, tendências de linguagem, normas culturais, formas de arte, expressões religiosas, modelos económicos, etc.
Os vMEME codificam instruções para as nossas perspectivas do mundo, as suposições de como tudo funciona e a fundamentação lógica para as decisões que tomamos. Os vMEME representam as influências ambientais (culturais, sociais, educacionais, etc) que moldam não apenas as nossas mentes como as próprias células do cérebro. Eles circulam profundamente nos sistemas humanos e pulsam no centro das escolhas e da inteligência de cada indivíduo. São um produto da interacção do equipamento nos nossos sistemas nervosos com o ambiente e as condições de existência (onde se destacam o tempo, o lugar, os desafios e as circunstâncias) que enfrentamos.
Os vMEMES actuam a três níveis distintos: indivíduos (modelando as suas vidas e os seus valores, da sobrevivência mais básica no aldeão global até ao mais inacessível pensador); as organizações (determinando o seu sucesso ou o seu fracasso no mercado competitivo); e as sociedades (locais ou nacionais) que seguem modelos de existência dependentes de vMEMES com diferentes sentidos (democrático, conservador, etc).
O modelo da Dinâmica da Espiral foi já testado em mais de 50 mil pessoas de todo o mundo e mantem-se válido. Ele apresenta-se, graficamente, com este aspecto:

Os vMEMES actuam a três níveis distintos: indivíduos (modelando as suas vidas e os seus valores, da sobrevivência mais básica no aldeão global até ao mais inacessível pensador); as organizações (determinando o seu sucesso ou o seu fracasso no mercado competitivo); e as sociedades (locais ou nacionais) que seguem modelos de existência dependentes de vMEMES com diferentes sentidos (democrático, conservador, etc).
Wilber divide a espiral em dois grandes estádios: o primeiro contempla os níveis mais inferiores de desenvolvimento psicológico e onde se situa a maioria da população mundial (das nações, dos governos, das empresas); o segundo abrange os níveis mais evoluídos e contempla um número mais restricto mas psicologicamente e culturalmente poderoso.
São nove os níveis de evolução humana propostos por Ken Wilber com base no modelo inicial de Graves e conforme a predominância dos vários vMEMES:
Nível 1 (prevalece o instinto de sobrevivência, a prioridade é dada aos alimentos, ao calor, ao sexo e à segurança). Encontra-se ainda, segundo Wilber, em 0,1% da população adulta mas também se observa em todos os bebés recém-nascidos, nos sem-abrigo, nas massas de população faminta do Sudão e de outras regiões inóspitas.
Nível 2 (predomina o pensamento animista). Estão neste estádio cerca de 10% da população e pode ser encontrado nos gangs, nas “tribos” corporativas, nas populações devotadas a rituais mágicos, pactos de sangue, crenças e superstições étnicas de cariz mágico.
Nível 3 (mentalidade feudal). Encontram-se neste nível cerca de 20% da população adulta mundial e 5% do poder está nas suas mãos. Pertencem a este nível reinos feudais da Ásia muçulmana, líderes de gangs, juventude rebelde, crianças entre os 2 e os 3 anos de idade e mentalidades de fronteira (lutam sobretudo pela posse de territórios).
Nível 4 (mentalidade conservadora e corporativa). 40% da população adulta mundial vive neste nível de existência e detem 30% do poder. São exemplos a América puritana, a antiga China confucionista, o judaísmo hassídico, o fundamentalismo religioso cristão e islâmico, grupos como o Exército da Salvação, os escuteiros e ideias como o patriotismo, organizações.
Nível 5 (mentalidade racional-materialista). Encontra-se em 30% da população que detem 50% do poder actual. Indivíduos e sociedades altamente orientadas para os resultados: Wall Street, classes médias emergentes no mundo ocientalizado, colonialismo, indústria da moda, etc.
Nível 6 (ecológico e comunitário). Neste nível vivem cerca de 10% da população que detem 15% do poder. Sensíveis ao equilíbrio ecológico, contra as hierarquias estabelecidas, as pessoas que estão neste estádio são fortemente pluralistas, defendem o multiculturalismo e a igualdade. Encontram-se nos movimentos ecologistas, no idealismo holandês, nas organizações não-governamentais como os Médicos Sem Fronteiras, nos partidos “os verdes” da Europa, etc.
Nível 7 (integrador). Um por cento da população, com cinco por cento de poder situam-se neste nível. Defendem um mundo sem fronteiras, igualitário, transcendente, solidário. A flexibilidade, a espontaneidade e a funcionalidade têm prioridade máxima. Exemplos: a Teoria do Caos, a “nova física” de Fred Allan Wolf, ensinamentos de Deepak Chopra.
Nível 8 (holístico, visão global). Apenas 0,1% da população está neste estádio e detem 1% do poder. Crença principal: o mundo é um único organismo dinâmico, com a sua própria mente colectiva. Exemplos: o conceito de “aldeia global” de McLuhan, as ideias de Gandhi de harmonia pluralista, os ensinamentos do filósofo Ken Wilber, a “hipótese Gaia” de James Lavelock e a “noosfera” de Pierre Teilhard de Chardin.
O mais brilhante filósofo da actualidade - Ken Wilber - cujos ensinamentos são um exemplo do nível 8 defende um próximo estádio, o 9º:
Nível 9: (integral e holónico). Estará lentamente a emergir em alguns (poucos) núcleos. Wilber, em A Theory of Everything defende uma nova humanidade que altere radicalmente velhos paradigmas e conflitos despertando nos indivíduos o aproveitamento integral das potencialidades humanas. O núcleo central deste “movimento para cima” situa-se no Instituto Integral (Estados Unidos) e tem atraido personalidades e investigadores de distintas disciplinas tais como David Chalmers, Howard Gardner (teorizador das Inteligências Múltiplas), John Searle (conhecido estudioso do fenómeno da consciência), o físico Ervin Lasszlo, o biólogo Francisco Varela (entretanto falecido), Larry Dossey, etc.
Na chamada consciência de segunda camada (isto é, aquela que surge a partir do "estádio integrador", níveis 8 e 9) estão poucas pessoas "porque constitui, no presente momento, a linha da frente da evolução humana colectiva". São estes que estarão a mudar o mundo.
Os novos líderes, a quem os investigadores Don E Beck e Christopher C Cowan chamam de Feiticeiros da Espiral, devem seguir 5 princípios:
- reconhecer as forças mentais que existem "na cabeça" das pessoas que lideram;
- incorporar um estilo universal de liderança C-A-A (cortesia, abertura mental e autocracia positiva);
- exercer as opções de intervenção apropriada nas situações;
- seguir as seis "Regras do Polegar" (oportunamente desenvolverei esta ideia);
- activar o pensamento de segundo nível (estágio integrador e seguintes) para incidir na liderança.
Actualmente e porque os líderes do velho sistema (a sociedade conotada com a "2ª vaga" de Alvin Tofler) ainda são a grande maioria, repartem-se por distintos estilos de liderança. São eles: o comunitário/tribal; o racional/económico; o moralista/prescritivo; e, o explorador/egocêntrico.