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A ILUSÃO DO DINHEIRO


O mundo do homem é sobretudo mental. Nada do que fazemos escapa ao que se passa na mente pois é dela que tudo deriva: um gesto, um pensamento, uma escolha.O nosso mundo é pois feito também de símbolos, crenças, saberes, emoções, fantasias e ilusões. Nada do que fazemos escapa a essa riqueza de entidades mentais sem as quais ficaríamos cativos de comportamentos absolutamente racionais e mecanizados. É aqui que entra o tema deste artigo: a ilusão do dinheiro.

A importância que ele adquiriu nas sociedades modernas - servindo como meio de troca para todas as atividades transacionadas - fez com que assumisse também um valor psicológico que ultrapassa em muito o seu valor real.

Na verdade o dinheiro, mesmo sob a forma de moeda, é uma abstração completa. Veja-se como o valor daquilo que se transaciona varia fortemente conforme o ambiente económico, as decisões políticas, as incertezas relativas ao futuro, etc.

O dinheiro traduz-se em números. Transacionam-se números que expressam quantidades: muito, razoável, pouco ou nada. O valor das coisas - dos objectos aos serviços - é assim substituído por um número que tem como referência uma moeda (dólares, euros, rublos, etc.).

Dizia há tempos uma senhora - que ganhara largas dezenas de milhões de euros - que não tinha a percepção do verdadeiro valor do prémio obtido no jogo Euromilhões. Para ela, pessoa que sempre vivera pobre e desafortunada, custava-lhe apreender a quantia que tinha agora depositada na sua conta. De um dia para outro saiu da pobreza para uma vida milionária. 

Aquilo que mais me impressionou foi o facto dela ter começado imediatamente a gastar dinheiro numa série de bens típicos daqueles a que costumamos chamar de "novos ricos" (automóveis topo de gama, vivendas, viagens, etc.). Mais curioso foi ela ter dito aos jornais que não queria que seus filhos, ainda adolescentes, trabalhassem mais! Ora a sua fortuna era grande, de facto, mas depressa ia começar a diminuir se mantivesse esse deslumbramento perante um número que não era capaz de compreender. Não obstante ter ficado milionária ela pouco mais ganhara do que aquilo que os melhores jogadores de futebol usufruem anualmente.

E aqui reside uma das formas de ilusão do dinheiro: o deslumbramento e a perda de sentido crítico. No caso em apreço, podemos ver as diferenças: um grande jogador de futebol ou um grande artista de cinema pode ganhar muito dinheiro ao longo de vários anos; aquela senhora apenas teve a sorte de ganhar um jogo. Ou seja, ela não recebeu o dinheiro em troca de trabalho feito. Ora, se não souber investir e não se proteger, dentro de pouco tempo estará de regresso à miséria. O deslumbramento é perigoso porque nos faz perder a noção da realidade e dos limites em que agimos.

Na atual crise económico-financeira que a Europa atravessa, o dinheiro (e o que ele representa) é a grande preocupação dos governos e das populações. É que, por natureza, o dinheiro é um bem escasso. Fabricar mais notas e moedas faz enfraquecer o valor do dinheiro. Não obstante, muitas pessoas acreditam que para resolver uma crise como a que a Europa vive bastaria fazer mais dinheiro e fazê-lo chegar ao mercado.

A PSICOLOGIA DO DINHEIRO
Quando a psicologia começou a interessar-se pelo tema "dinheiro" descobriu que o seu valor percebido variava de pessoa para pessoa, independentemente das quantias envolvidas. Para um milionário, perder 1 milhão de euros pode ser insignificante. Para um pobre, perder 1 só euro pode ser tudo o que ele tem para comer.

Também se descobriu que ele está ligado ao estatuto social. Ter ou não ter dinheiro leva muitas pessoas a adotarem atitudes diferentes não em função da riqueza adquirida mas do seu significado social. Isso leva a que muitas pessoas se entreguem à compra de bens de valor elevado para poderem afirmar-se perante os outros através do puro exibicionismo. A discreção dá lugar à ostentação. É o dinheiro-estatuto em ação.

Assim, a psicologia criou várias medidas relativas ao significado do dinheiro para as pessoas. Vejamos:

O Diferencial Semântico Modificado (DSM), apresentado em 1972, revela a importância que as pessoas atribuem ao dinheiro. Envolve fatores como segurança, fracasso e até pecado.

A Escala de Atitudes quanto ao Dinheiro (MAS), de 1982, envolve 60 itens de acordo com a teoria psicanalítica. O prestígio, a avareza e o pessimismo estão entre os que mais se destacam.

Já a Escala de Significado do Dinheiro (ESD), de 2000, apresenta duas dimensões: as positivas (que incluem o prazer e o prestígio) e as negativas (a preocupação, a dominação, etc.)

Finalmente, a Escala Ética do Dinheiro (EAD), de 1992, procura medir as atitudes das pessoas face ao dinheiro numa perspetiva de trabalho e negócio.

EVITAR A ILUSÃO
O papel que a ilusão desempenha na nossa relação com o dinheiro é pois muito variável e depende de fatores como a educação, o estatuto social e o perfil psicológico. Para muitas pessoas o dinheiro é desprezível e causador de todos os males. Para outras o dinheiro é uma entidade mágica e adorada e pela qual estão dispostas a tudo fazer para o alcançarem (trabalhando duro, jogando nas lotarias ou seguir outros caminhos menos éticos como a corrupção e o roubo).

Gerador de múltiplos efeitos psicológicos e comportamentais, o dinheiro merece que sobre o mesmo se faça uma verdadeira aprendizagem: a de saber geri-lo. É pois hoje tema de educação (a educação financeira) junto das crianças para que não se deixem envolver por ilusões e fantasias que conduzam a tentações destruidoras e enganadoras (dinheiro fácil, jogo ilícito, roubos, avareza, etc.).

O uso do dinheiro deve apelar ao nosso pragmatismo e sentido crítico para que dele não fiquemos prisioneiros nem escravos. O dinheiro vale o que vale. Sim, é um bem escasso. Mas, por isso mesmo, não merece mais do que uma atitude realista da nossa parte para que tenhamos acesso a ele graças a um contributo moralmente justo como o trabalho.

Nelson S. Lima