Pesquisar neste blogue

SIGA ESTE SITE:

Translate

VEJA O MEU BLOGUE PRIVADO:

SOBRE EMOÇÕES, LEIA MEU BLOGUE:

VEJA AGORA

VEJA AGORA

MATRIX: A REALIDADE É UMA ILUSÃO?


O UNIVERSO É UM COMPUTADOR?

"O tabuleiro de xadrez é o mundo; as peças são os fenômenos do Universo; as regras do jogo são o que chamamos de Leis da Natureza. O jogador no outro lado está oculto a nós".
Thomas H. Huxley.

E se tudo o que você vê for apenas uma simulação de computador? O filme Matrix provoca a idéia, com a ajuda de surpreendentes efeitos visuais – criados justamente por computadores, e que parecem incrivelmente reais. Na produção da sequência, Matrix Reloaded, o supervisor de efeitos especiais John Gaeta comentou que as imagens geradas por sua equipe são tão impressionantes que “talvez nossa tecnologia se torne a verdadeira Matrix, e nós tenhamos inadvertidamente liberado o frasco de coisa verde no planeta”. Mas o que deve intrigar mesmo é que existem propostas científicas sérias de que todo o Universo, incluindo nós mesmos, seja em essência o resultado de um grande computador.

Já em fins dos anos 60, o alemão Konrad Zuse sugeria que todo o Universo estaria tendo lugar nas entranhas lógicas de um computador. Zuse não era um maluco qualquer: ele construiu os primeiros computadores eletromecânicos programáveis do mundo, desenvolveu a primeira linguagem de computador de alto-nível, e, entre tantas outras coisas, criou o primeiro programa de xadrez em um computador.

O que não deixa de ser curioso, dada a metáfora do naturalista do século XIX Thomas Huxley que introduz este artigo. A sugestão de Zuse fazia referência ao tipo de computador em particular que estaria ‘passando’ o nosso Universo, denominado autômato celular. O conceito deste tipo de computador foi criado por outro grande pioneiro, o matemático húngaro John von Neumann, nos anos 40 – a propósito, como uma base da idéia de sistemas lógicos que fossem auto-reprodutores e que imitassem assim a própria vida.

Para entender basicamente o que são autômatos celulares, e eles são um tanto diferentes do computador a que estamos acostumados, começamos com a metáfora de xadrez de Huxley. Deite fora as peças, e fique apenas com o tabuleiro. Cada casa do tabuleiro é uma célula, e cada uma destas células pode ser branca ou preta. Agora, a cor destas células não depende mais do padrão monótono e fixo do xadrez, mas pode mudar de acordo com regras simples implementadas dentro de cada uma delas. Estas regras são executadas em todas as células simultaneamente, toda vez que um relógio bate. O tabuleiro é agora um autômato celular. Cada célula deste autômato pode, por exemplo, ter o seguinte conjunto de regras: se houver três células imediatamente vizinhas brancas, ela deve ficar ou continuar branca. Se houver duas células vizinhas brancas, sua cor não deve mudar. Se houver menos de duas ou mais de três vizinhas brancas, deve ficar ou continuar preta. E isso é tudo.

Se você leu essas regras, o que deve ter sido um tanto chato, pelo menos deve ter percebido que elas são muito simples. Mas a partir delas, executadas em cada célula de nosso autômato, uma ordem incrível de complexidade pode surgir. Isso foi demonstrado de forma bela por um programa de computador que se tornou uma febre nos anos 70: o Game of Life de John Conway.

Usando exatamente as regras descritas acima, cada célula branca estava ‘viva’, e as pretas, ‘mortas’. Numa época que hoje já parece remota, onde o tempo dos computadores era caríssimo, horas e horas foram gastas por pesquisadores fascinados observando como uma ordem inesperada surgia: quadrados piscando, triângulos andando e flechas zunindo, tudo em padrões complexos mudando, a cada batida do relógio.

E resulta que mesmo um autômato celular de regras simples como o Game of Life de Conway pode funcionar como um computador universal: isto é, representando informação como células brancas ou pretas, e dispondo diversas outras células de forma determinada, este simples jogo de computador pode em tese simular qualquer computador imaginável, dando seus resultados como um determinado padrão de células.

A capacidade de computação universal de autômatos celulares simples nos leva de volta às especulações de que o Universo seja um computador. Essa especulação fantástica deriva essencialmente de uma suposição: a de que o Universo seja discreto, em outras palavras, que seja em essência digital.

O mundo pode parecer contínuo, analógico em muitos aspectos: basta olhar para o arco-íris que parece variar suas cores continuamente. Mas apenas parece: a luz é composta de partículas discretas chamadas fótons.

No mundo do infinitamente pequeno, regido pelas leis da física quântica, o infinitamente pequeno pode simplesmente não existir: as ações se dariam em pacotes, de forma discreta, em quanta. Até mesmo o tempo e o espaço não seriam contínuos: existiria uma quantidade mínima de tempo e espaço passível de ser medida, e possivelmente, de acontecer em nosso Universo. Num Universo em que tempo e espaço ocorrem aos pulsos é justamente o universo dos autômatos celulares.

O padrão de pigmentação em conchas pode ser reproduzido por autômatos celulares com regras definidas. Para Wolfram, isto evidencia processos de computação já ocorrendo na natureza. “Nossa tese é de que algum modelo de autômato celular pode, em efeito, ser programado para funcionar como a Física [do Universo]”, diz Edward Fredkin, da Universidade de Boston. Fredkin já foi director do laboratório de ciência de computação do M.I.T., e tem sido um dos mais notáveis promotores do Universo como um computador. Sua ‘Mecânica Digital’ explicaria mesmo os mais incompreensíveis aspectos da mecânica quântica.

Contudo, o mais novo e ardoroso defensor desta abordagem é Stephen Wolfram, criador de um dos mais usados softwares de computação técnica do mundo. Wolfram ficou milionário, e dedicou os últimos anos a uma busca obstinada – e em grande parte obscura – para demonstrar que autômatos celulares podem responder por toda a complexidade que enxergamos no mundo.No ano passado, Wolfram finalmente lançou o livro A New Kind of Science (Um Novo Tipo de Ciência), um tomo volumoso replecto de gravuras, complementado por programas de computador de demonstração. Tornou-se brevemente um best-seller, um feito notável considerando as mais de 1.000 páginas e o tema hermético, mas não agradou muito à comunidade científica. Wolfram é acusado de não reconhecer plenamente o trabalho de outros cientistas nas teorias e idéias que expõe, de não apresentar idéias realmente novas, além de tentar levar todas elas longe demais sem a base necessária.

Não é novo, e não é ciência”, escreveu o crítico David Drysdale. O livro de Wolfram e, é claro, o filme Matrix, divulgam cada vez mais a idéia de que o Universo seja um computador. Por trás dessa divulgação ampla, os seus criadores, de Zuse a Fredkin, ofereceram uma hipótese séria e tantalizante. Talvez, perguntar ‘o que é Matrix?’ seja no final das contas a mesma pergunta fundamental feita pela ciência: o que é o Universo?

Edward Fredkin está procurando pelo carro no estacionamento, quando seu filho diz: “Eu sei exatamente onde o carro está!”. Surpreso, ele pergunta “onde?”. Ao que ouve “O carro está no Universo”. Caso o Universo seja um computador funcionando em algum lugar, nós podemos estar igualmente certos de que onde quer seja, não é neste Universo: como Fredkin chama, o lugar onde nosso Universo estaria é o Outro. Podemos saber pouco sobre o Outro. Uma vez que contém algo que é responsável por nosso Universo, e como nosso Universo pode criar computadores universais, então o Outro é certamente capaz de produzir computadores universais. Além disso, se as leis físicas que conhecemos são resultado de regras em um autômato celular, podem existir muitas outras regras, muitos outros universos. E todos eles podem estar contidos no Outro, que por sua vez pode ter leis físicas imponderáveis a nós. Estudar nosso Universo não diz muito mais do que isso sobre o Outro.

Entretanto, não resistimos imaginar por que ele estaria ‘passando’ o nosso Universo. Num de seus melhores contos, o escritor de ficção científica Isaac Asimov escreveu sobre “A Última Pergunta”: como evitar o destino de nosso Universo em expansão, a morte térmica. O ano é 2061, e como não poderia deixar de ser, a pergunta é feita a um computador. Depois de um breve silêncio, o computador informa: “Dados insuficientes para uma resposta”. E ao longo de centenas bilhões de anos, a humanidade se expande pelo Universo e se funde com seus computadores – sempre para descobrir que a última pergunta ainda não pode ser respondida. Ao fim, quando todo o Universo é englobado pelo Computador, quando o caos já reina, ele finalmente chega a uma resposta. Mas já não há ninguém para conhecê-la excepto ele mesmo. A resposta deve ser dada então por demonstração, e a entropia do Universo será revertida. E o Computador diz: “Que se faça a luz!”. E houve luz.

Ficção à parte, se nosso Universo é apenas um dentre muitos que podem ocorrer no Outro, talvez não exista um Criador, ou melhor, um Programador. Como nota Jürgen Schmidhuber, do Instituto Dalle Molle de Estudos em Inteligência Artificial na Suíça, em nosso Universo-computador uma xícara de chá não só seria resultado de cálculos, como estaria efetuando cálculos para existir. O que ela computa? Provavelmente nada muito interessante, mas se ela é um computador efetuando um cálculo qualquer, nosso próprio Universo poderia estar tendo lugar no Outro como algo tão desinteressante quanto uma xícara de chá é para nós.
Aos que ficarem desanimados com a idéia, podemos voltar à ficção científica. Em ‘O Mochileiro das Galáxias’, Douglas Adams conta que fomos criados para computar a resposta da Grande Questão da Vida, do Universo e Tudo. A resposta? 42.

Leia:
- Life32 - versão freeware para Windows(r) do Game of Life
- Cellular Automata - Uma excelente introdução a autômatos celulares
- The World According to Wolfram - Resenha do livro de Wolfram

Apesar do que possa parecer, este não é um plágio do artigo 'Matrix: A realidade é uma ilusão?' de Rafael Kenski, publicado em maio de 2003 na revista SuperInteressante. Todo este artigo foi escrito no começo de abril de 2003 para um outro projecto, mas teve que ser descartado justamente por causa da (realmente embasbacante) semelhança com o artigo publicado em Maio na revista SI. Não sei se implantes alienígenas em meu cérebro transmitiram este artigo para a mente de Kenski, provavelmente um alienígena reptiliano disfarçado entre nós.

Fonte: Kentaro Mori. Com adaptações.